Entenda o debate
A discussão definirá o destino de mais de 935 apurações e ações penais paralisadas no Ministério Público após decisão liminar do próprio Toffoli, datada de julho, quando mandou parar casos que contenham dados compartilhados sem autorização prévia da justiça.
“Talvez o mais importante aqui seja a questão da supervisão judicial para evitar abusos de investigações de gaveta que servem apenas para assassinar reputações sem ter elementos ilícitos nenhum. Isso pode ser utilizado contra qualquer cidadão, contra qualquer empresa e isso é nosso dever coarctar (restringir, limitar)”, afirmou o presidente da Corte em seu voto.
Toffoli não esclareceu, todavia, de que forma deve ser feita essa supervisão judicial.
Os órgãos impactados pela liminar de Toffoli defendem a troca de dados sem necessidade de autorização prévia da justiça, como forma de dar agilidade às investigações e cumprir com os padrões internacionais de combate à lavagem de dinheiro e ao terrorismo.
A Unidade de Inteligência Financeira (UIF) – antigo Coaf -, a Receita Federal e o Ministério Público Federal apontam prejuízos ao combate à corrupção e ao crime organizado caso a posição definida na liminar de Toffoli prevaleça. O ministro, contudo, sinalizou antes do julgamento que tentará fazer uma modulação – isto é, estabelecer critérios para atenuar o alcance da decisão.
Na sessão, o procurador-geral da República, Augusto Aras, afirmou que não é necessário a autorização prévia da justiça para que o Coaf ou a Receita compartilhem dados com o MPF.
“Esse sistema opera em 184 países do mundo e o Brasil necessita respeitar esse sistema, porque não é só os aspectos de combate à lavagem de capitais, não é só a lei anticorrupção que está em causa nesse julgamento, é também a credibilidade do sistema financeiro brasileiro”, frisou Aras. “É um momento crucial para o crescimento econômico do país, que mantenhamos a estrutura da segurança jurídica também para essas relações econômicas tão relevantes.”
Entre os processos paralisados por determinação de Dias Toffoli estão investigações sobre crimes contra a ordem tributária, relacionados à lavagem ou ocultação de bens, além de apurações sobre crimes ambientais na Amazônia, contrabando e corrupção. Se o Supremo decidir que é necessária a autorização de um juiz para o envio dos dados, a Lava Jato sofrerá mais uma derrota.
Um dos casos é o do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro. Foi devido a um pedido da defesa do senador que Toffoli tomou a decisão de suspender as investigações, sob a alegação de que houve quebra ilegal de sigilo bancário por parte dos procuradores, que acessaram relatórios do Coaf sem uma decisão judicial.
“O caso de Flávio Bolsonaro não é objeto deste julgamento”, esquivou-se Toffoli em declaração no início da sessão, sob o olhar atento de Frederick Wassef – advogado do senador e filho do presidente -, também presente no plenário. Wassef não quis falar com a imprensa no intervalo.
À imprensa, Aras, depois da primeira parte do julgamento, disse que “ainda é cedo para um juízo de valor”. “Nós ainda precisamos esperar que a Corte se manifeste.”
O caso em análise pelo Supremo gira em torno de um processo de sonegação fiscal envolvendo donos de um posto de gasolina em Americana, no interior de São Paulo. A defesa dos empresários acusa a Receita Federal de extrapolar suas funções ao passar dados sigilosos sem aval da Justiça.
O processo ganhou repercussão geral, ou seja, o entendimento firmado pelo Supremo deve ser aplicado para outros casos nos diversos tribunais do País. A expectativa é de que o tribunal fixe critérios para o repasse de dados sigilosos, em uma discussão que deve mais uma vez rachar o plenário.