Policiais militares do Ceará encerram motim após 13 dias

Setores da Polícia Militar do Ceará organizaram motim por aumento de salários  -  Governo do Ceará  

Após 13 dias de paralisação, policiais militares decidiram encerrar na noite de hoje o motim que resultou em um aumento da criminalidade no estado.
Representantes do governo e dos amotinados chegaram a um acordo que não prevê anistia. Os processos disciplinares sobre os PMs que participaram do movimento serão acompanhados por uma comissão externa formada por representantes da Ordem dos Advogados do Brasil, Defensoria Pública e do Ministério Público para que seja observado o devido processo legal em cada caso.
Segundo a Defensoria Pública, o acordo fechado prevê que:
  • Os policiais militares contarão com o apoio de instituições extra-governamentais, como a OAB, Defensoria Pública e Exército;
  • Os agentes terão direito a um processo legal sem perseguição, com amplo direito a defesa e contraditório, e acompanhamento das instituições de apoio;
  • O governo do Ceará não vai transferir policiais que tenham relação com o movimento para o interior do estado em um prazo de 180 dias, contados a partir do fim do motim;
  • Revisão de todos os processos adotados contra policiais militares durante a paralisação;
  • Garantia de investimento de R$ 495 milhões com o salário de policiais até 2022;
  • Desocupação de todos os batalhões onde havia policiais amotinados até 23h59 deste domingo;
  • Os policiais militares devem retornar ao trabalho às 8h desta segunda-feira (2)
O presidente da seccional cearense da OAB, Erinaldo Dantas, disse que a criação da comissão externa para acompanhar os processos foi um ponto-chave para o término da paralisação. "Eles estavam muito preocupados com perseguições e demissões em massa", disse Erinaldo Dantas.
"Nessa negociação você não tem vencedores nem vencidos. Quem ganha é a sociedade cearense, que estava convivendo com tanta violência", acrescentou.
De acordo com dados da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social, o estado viveu o período mais violento deste ano: as 29 mortes registradas entre as 6h de quarta-feira (dia 19) e às 6h de quinta (20) extrapolam a média de 6 assassinatos por dia registradas no estado de 1º de janeiro a 18 de fevereiro.
Na semana passada, homens encapuzados fecharam a base na Ciopaer (Coordenadoria Integrada de Operações Aéreas) e o BPRaio (Batalhão de Ronda e Ações Intensivas e Ostensivas) em Sobral (a 270 km de Fortaleza), cidade onde o senador Cid Gomes (PDT-CE) foi baleado, após tentar entrar em um quartel com uma retroescavadeira.
Diante do impasse nas negociações entre governo estadual e grevistas, o presidente Jair Bolsonaro decidiu assinar um novo decreto para estender por mais uma semana a operação de GLO (Garantia da Lei e da Ordem) no Ceará. A operação se estenderá até a próxima sexta-feira (6).
O governador Camilo Santana (PT) havia solicitado a renovação da medida, que autoriza a presença das Forças Armadas no estado, por mais 30 dias. O Planalto, porém, avaliou que a medida deva ser usada em caso de extrema urgência. Segundo integrantes do governo, há um temor de banalização do uso da operação.
O ministro da Justiça, Sergio Moro, afirmou ontem que o motim de policiais militares no Ceará era "ilegal", durante palestra realizada no Consud (Consórcio de Integração Sul e Sudeste).
Hoje, após a divulgação do fim da paralisação, Moro afirmou que "prevaleceu o bom senso".

Negociação final durou sete horas

A proposta de acordo foi entregue aos PMs por uma comissão formada por membros do governo cearense, do Poder legislativo e Judiciário do estado. A reunião demorou cerca de sete horas.
Após esse encontro, os amotinados realizaram uma assembleia que durou uma hora e meia e resultou no fim da paralisação. Um dos líderes do movimento, Cabo Sabino, se posicionou contra o encerramento do motim. De posse do microfone, ele afirmou que "vocês [os PMs} acabaram de assinar minha demissão".

O montante a ser destinado para a reestruturação da carreira dos militares também permanecerá no patamar da proposta inicial do governo cearense: R$ 495 milhões. Mas haverá reabertura do debate na Assembleia Legislativa do Ceará para que esse valor possa ser redistribuído entre os diversos níveis da carreira militar.
A Defensora Pública Geral do Ceará Elizabeth Chagas descreveu que os momentos finais da negociação foram muito tensos, com familiares e militares demonstrando apreensão no 13° dia de paralisação.
"A sensação agora é que a gente pode respirar em paz no Ceará. Após um período de muita instabilidade", disse. Para Elizabeth, foi preciso trazer sensibilidade e humanização para facilitar o processo de negociação. "Isso permitiu que pudéssemos evoluir. Foi a melhor saída para o governo, para os policiais e para a população, que estava muito vulnerável", afirmou a defensora.