Em dois artigos publicados na
revista Science, os astrônomos descrevem como rastrearam os neutrinos,
que revelaram chegar à Terra desde o blazar TXS 0506+056. Essa galáxia
está localizada pouco depois da Constelação de Órion, a 3,7 bilhões de
anos-luz daqui. Uma característica do TXS é que, em seus polos, há dois
jatos apontando para o Planeta Azul, e de onde a galáxia “cospe”
partículas fundamentais, incluindo os rápidos neutrinos.
Os
primeiros neutrinos foram criados durante o Big Bang, mas essas
partículas continuam sendo produzidas em reações nucleares que acontecem
em todo o Cosmos. A maioria dos que chega à Terra nasce no Sol ou em
supernovas (fase final da vida de uma estrela). Porém, aqueles que
atingem o planeta com níveis altíssimos de energia derivam da mesma
fonte dos raios cósmicos — partículas muito energéticas formadas fora do
Sistema Solar. Diferentemente dos neutrinos, os raios têm carga e, por
isso, são “dobrados” pelos campos magnéticos. Por sua vez, por não ser
carregado, o neutrino não é afetado por esses escudos e, como passa
através da matéria, pode ser usado para traçar o caminho direto à sua
fonte.
Foi o que fez o Observatório de
Neutrinos IceCube, na Antártida. O laboratório construído no continente
gelado é equipado com um sistema de alarme quase em tempo real, que
dispara quando um neutrino de altíssima energia colide com um núcleo
atômico perto do detector. Colisões do tipo são muito raras, mas
produzem uma assinatura que não deixa sombra de dúvidas. Trata-se de um
cone de luz azul que é mapeado pelos 5 mil tubos fotomultiplicadores do
IceCube. Essa luz é criada por partículas secundárias originárias do
momento da colisão, e ela aponta para direção exata do neutrino. Quando
um fenômeno desse ocorre, o laboratório lança um alerta para
observatórios parceiros, incluindo o Telescópio Espacial de Raios Gama
Fermi, da Agência Espacial, e o europeu Telescópio Cherenkov de Imagens
Gama (também chamado de Magic), nas Ilhas Canárias.
Raridades
Em 22 de setembro do ano
passado, o alarme soou. Na ocasião, milhares de neutrinos de altíssima
energia atingiam o Polo Sul e, desses, um único foi detectado pelo
IceCube. Seis dias depois, do espaço, o Fermi foi o primeiro a
identificar a atividade de raios gama vindo do blazar TXS 0506 056, a
0,06 grau desse neutrino. Em seguida, o Magic confirmou a fonte. “Os
neutrinos raramente interagem com a matéria. Detectá-los no Cosmos já é
incrível, mas identificar uma possível fonte é um triunfo. Esse
resultado nos permitirá estudar as mais distantes e poderosas fontes de
energia do Universo de uma forma completamente nova”, opina Paul
O’Brien, chefe do Departamento de Física e Astronomia da Universidade de
Leicester, uma das instituições envolvidas no estudo.
“A
evidência da observação da primeira fonte de neutrinos altamente
energéticos e dos raios cósmicos é extremamente convincente”, disse
Francis Halzen, principal pesquisador do Observatório Neutrino IceCube e
professor da Universidade de Wisconsin-Madison, em uma coletiva de
imprensa organizada pela Fundação Nacional de Ciências dos Estados
Unidos, uma das principais financiadoras do estudo.
Halzen
destacou que essa é mais uma vitória do campo da astronomia
multimensageiros, quando diferentes sinais enviados pelo Cosmos são
detectados, identificados e confirmados por vários instrumentos
astronômicos. “A era da astrofísica está aqui. Cada mensageiro — de
radiação eletromagnética a ondas gravitacionais e, agora, neutrinos —
nos dá uma compreensão mais completa do Universo e importantes novas
ideias sobre os mais poderosos objetos e ventos no céu. Esse foi apenas o
começo. Agora sabemos de um lugar muito interessante no céu”, declarou.
“Há
anos observamos neutrinos, mas não sabíamos de onde vinham e agora
estamos começando a conhecer sua origem. O IceCube foi construído
justamente para tanto e, por isso, essa é uma época muito empolgante
para a astronomia de neutrinos”, afirma Marcos Santander, professor de
astrofísica da Universidade do Alabama que ajudou na descoberta.
“Estamos começando a fazer astronomia usando outros meios além da luz,
combinando as observações eletromagnéticas com outras medidas. Essa é a
primeira evidência de que temos uma galáxia emitindo neutrinos, o que
significa que, logo, poderemos começar a observar o Universo usando as
partículas subatômicas para aprender mais sobre esses objetos de uma
forma que seria impossível somente com a luz”, afirma.
"Detectá-los no Cosmos já é incrível, mas identificar uma possível fonte é um triunfo. Esse resultado nos permitirá estudar as mais distantes e poderosas fontes de energia do Universo de uma forma completamente nova”
Paul O’Brien, chefe do Departamento de Física e Astronomia da Universidade de Leicester, uma das instituições envolvidas no estudo