Após atravessar o ano na mira da opinião pública por uma série de julgamentos de temas polêmicos, o STF (Supremo Tribunal Federal)
entra em 2020 com mudanças à vista que podem alterar o perfil do
principal tribunal do país, fazendo a balança dos pleitos pender para
teses favoráveis às práticas da Operação Lava Jato.
Entre as novidades para o próximo ano, estão a troca de presidente e a saída do ministro há mais tempo na Corte.
Este será o último ano do ministro Dias Toffoli
na presidência da corte. Em setembro, ele dará lugar ao ministro Luiz
Fux no comando do STF. Cabe ao presidente do tribunal a prerrogativa de
definir a pauta de julgamentos do tribunal, estabelecendo quais ações
serão analisadas pelo plenário e em qual data.
Em julgamentos de
temas penais, Fux costuma votar de forma oposta à de Toffoli, integrando
a minoria de ministros que, no plenário do Supremo, esse ano se alinhou
às posições defendidas pela Lava Jato.
Na definição sobre a possibilidade de execução da pena após condenação em segunda instância,
Fux foi um dos cinco ministros que votaram favoravelmente às prisões.
Toffoli deu o voto que definiu o julgamento em 6 a 5 contra a prisão
nessa etapa do processo.
Também neste ano, Fux votou contrariamente à tese sobre a ordem de alegações finais que poderia levar à anulação de sentenças da Lava Jato. O ministro terminou derrotado nesse julgamento, por 7 votos a 4, com Toffoli integrando o placar da maioria.
Um terceiro julgamento que colocou Fux em oposição a Toffoli foi a decisão sobre se a Justiça Eleitoral ficaria responsável por casos de corrupção associada a crimes eleitorais. Fux disse que não. Terminou derrotado por 6 votos a 5, com Toffoli novamente do lado da maioria.
Despedida do decano
Este
também é o último ano de atuação no STF do ministro Celso de Mello, que
até novembro deverá se aposentar compulsoriamente por completar a idade
de 75 anos.
Isso abrirá a possibilidade de que o presidente Jair Bolsonaro
(sem partido) faça sua primeira indicação ao STF. Entre os nomes
lembrados como possíveis indicados estão o ministro da AGU
(Advocacia-Geral da União) André Mendonça e o ministro da Justiça, Sergio Moro.
A
saída do ministro Celso de Mello e a chegada de um nome próximo às
teses do governo Bolsonaro pode inverter o placar em julgamentos de
temas caros à Lava Jato. Por exemplo, Celso de Mello votou
contrariamente à prisão em segunda instância, e a favor de que casos de
corrupção possam ser julgados pela Justiça Eleitoral.
Apesar de
esses temas já estarem decididos, e não estar previsto que sejam
novamente postos em julgamento, a alteração na composição do STF pode
alterar o equilíbrio que até então pendeu contra as teses defendidas
pela Lava Jato em julgamentos decididos pelo placar apertado de 6 votos a
5.
Indicado por Bolsonaro
É esperado que o presidente Bolsonaro indique ao menos dois nomes para o Supremo durante seus quatro anos de mandato.
Após
a aposentadoria compulsória do ministro Celso de Mello em 2020, o
próximo a deixar a corte ao completar 75 anos será o ministro Marco
Aurélio Mello, em julho de 2021. O mandato de Bolsonaro se encerra em
2022, quando ele poderá disputar a reeleição.
Entre os apontados como possíveis indicados por Bolsonaro para a vaga de Celso de Mello estão:
André Mendonça: ministro-chefe da AGU (Advocacia-Geral da União)
Humberto Martins: ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça)
Marcelo Bretas: juiz federal, responsável pela Lava Jato no Rio de Janeiro
Guilherme Schelb: procurador do MPF (Ministério Público Federal) e defensor do projeto Escola sem Partido
O
ministro Sergio Moro (Justiça) também é apontado como um possível
indicado ao STF por Bolsonaro, mas o mais provável é que o presidente
cogite indicar Moro apenas para a segunda vaga que será aberta em 2021.
Em sua primeira indicação ao Supremo, Bolsonaro prometeu um nome de perfil "terrivelmente evangélico".
Embora o adjetivo "terrível" tenha levado a diferentes interpretações
sobre a intenção do presidente, todos os cotados para o cargo possuem
ligações pessoais com a fé evangélica.
André Mendonça, da AGU, é pastor da Igreja Presbiteriana Esperança de Brasília.
O ministro Humberto Martins, do STJ, é adventista do sétimo dia. O juiz
Marcelo Bretas é de família evangélica e costuma citar trechos da
Bíblia nas sentenças que profere.
Já o procurador Guilherme Schelb
recebeu apoio da bancada evangélica quando foi cotado para comandar o
Ministério da Educação. Schelb um defensor do Escola sem Partido,
projeto contrário ao ensino de conteúdos relacionados a orientação
sexual nas escolas, tema caro a setores religiosos conservadores.
André Mendonça afirmou que a atuação dos ministros do STF deve ser
orientada pela Constituição e pelas leis, e não por posições religiosas
pessoais. "Quais são os grandes nortes? Em primeiro lugar, é a
Constituição, e em segundo lugar, as leis. Essa deve ser a baliza com
que qualquer jurista, qualquer advogado, qualquer magistrado deve
nortear a sua atuação", disse.
O indicado pelo presidente da República precisa ter o nome aprovado pelo Senado para assumir o cargo.
Presidência do STF
O ministro do STF Luiz Fux
Imagem: Bruno Rocha/Fotoarena/Estadão ConteúdoO
ministro Luiz Fux é atualmente o vice-presidente do STF. O ministro
ingressou no Supremo em 2011, tendo sido indicado ao cargo no governo da
ex-presidente Dilma Rousseff (PT).
Carioca, Fux foi juiz do
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, onde foi promovido a
desembargador. Em 2001 ele tomou posse como ministro do STJ (Superior
Tribunal de Justiça), cargo que ocupava antes de ingressar no STF.
Em
setembro chega ao fim o mandato de dois anos do ministro Dias Toffoli à
frente da presidência do STF. Assume o cargo Luiz Fux, que deve
permanecer na presidência da Corte até setembro de 2022.
Os
ministros ocupam a presidência do Supremo num tradicional sistema de
rodízio, onde o ministro mais antigo que nunca ocupou o cargo sucede o
atual presidente após um mandato de dois anos.
Menos polêmica em 2020
No
próximo ano, o STF dá sinais de que pretende evitar as grandes
polêmicas na sua pauta de julgamentos, diferentemente de 2019, quando
foram decididos temas como a prisão em segunda instância, a criminalização da homofobia e o compartilhamento de dados sigilosos pelo Coaf.
O calendário do primeiro semestre de 2020 deixou de fora
temas da chamada "pauta de costumes", capaz de contrariar setores
religiosos e conservadores que formam boa parte do apoio ao governo
Bolsonaro.
Por exemplo, o STF adiou a análise do processo sobre a
descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal, que estava
previsto ainda para 2019. O caso não foi julgado por causa de
remanejamentos na pauta e agora está adiado indefinidamente.
Estão no calendário de julgamentos do próximo ano
a rescisão do acordo de delação premiada dos empresários Joesley e
Wesley Batista, da JBS, as restrições à doação de sangue por
homossexuais, o tabelamento do frete do transporte de cargas por
caminhões, a prisão imediata de condenados pelo tribunal do júri e a
tese sobre a ordem das alegações finais dos réus no processo.
Este último tema, previsto para março, pode ter impacto na condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no processo sobre o sítio em Atibaia (SP).
O presidente do STF, Dias Toffoli
Em solenidade no STF na última semana, Toffoli previu um 2020 mais "tranquilo" no Supremo.
"Enfrentar temas polêmicos,
colocá-los em pauta e defini-los traz segurança jurídica e pacificação
social, por isso que nós optamos por fazer o julgamento de casos
polêmicos nesse ano de 2019, para exatamente trazer tranquilidade. E
veja que nós chegamos ao fim do ano com a sociedade bem tranquila perto
do que iniciamos 2019", disse o ministro.
"Os casos mais
polêmicos, penso que já diminuíram bastante. Então não há mais grandes
causas, vamos dizer, que emocionem toda a nação brasileira, vai ser uma
pauta mais tranquila, um ano mais tranquilo [em 2020]", afirmou Toffoli.